Ironia, paródia e metaficção historiográfica em Memorial do convento, de José Saramago
Resumo
RESUMO: Dentre os muitos romances de José Saramago, Memorial do Convento (1982) representa fortemente o projeto literário do autor, a saber: reflexões relativas à condição humana em sociedade, possibilitando a percepção do outrem em sua complexidade, demonstrando, no caso, olhares profundos sobre anônimos e conhecidos da História de Portugal. O presente artigo objetiva, logo, analisar como esse romance reconstrói o discurso da História oficial, por meio de detalhamento, utilizando recursos como ironia, paródia e intertextualidade, a fim de apresentar o “outro lado” dos fatos e das ações que envolveram a construção do Convento de Mafra, no período do reinado de El-Rei D. João V de Portugal, no século XVIII. Desse modo, Memorial do Convento pode ser considerado um romance de metaficção historiográfica (HUTCHEON, 1991), pelo fato de possibilitar o entendimento do discurso histórico como parcial, temporário, mutável e passível de direcionamento, assim como outros discursos construídos pelo intermédio da linguagem e, portanto, dependente de seu contexto de produção e de recepção. Além disso, observou-se que o romance de Saramago, ao representar os trabalhadores anônimos desconsiderados pela História oficial, apresenta-os com seus caracteres mais humanos, com suas angústias e tensões, sonhos e vontades, ao mesmo tempo em que denuncia a hipocrisia, a manipulação e as injustiças da sociedade da época. Tais características, no entanto, parecem estar também presentes em qualquer período histórico da vivência humana: portanto, as reflexões do romance se atualizam e fazem pensar, também, o momento presente do leitor.
PALAVRAS-CHAVE: Ironia; José Saramago; Metaficção Historiográfica; Romance Português Contemporâneo.
ABSTRACT: Among many novels written by Jose Saramago, Memorial do Convento (1982) can be considered as representative work of the author’s literary project, once it brings the reflections on the human condition in society, allowing the perception of other individuals’ complexity, which demonstrates insights on the famous and anonymous of Portugal’s History. The aim of this paper is to analyse how this novel rebuilds the official historical discourse by detailing it, and using irony, parody, and intertextuality, in order to present the “other version” of the facts and actions related to the construction of the Monastery of Mafra, D. João V from Portugal’s reign in the 18th century. Thus, Memorial do Convento can be considered a historiographic metafiction novel (HUTCHEON, 1991), because it allows the reader to understand the historical discourse as a partial, temporary, variable one, with possibility of being directed, as well as other discourses which are built through language and, therefore, dependent on their contexts of production and reception. Moreover, we notice that Saramago’s novel presents the anonymous workers, who had not been considered by the official historical discourse, showing their own human features, and their distresses, difficulties, dreams and wishes. At the same time, the novel denounces the hypocrisy, the manipulation and the injustices of that society. These elements, however, seem to exist in any historical period of human life. Thus, the novel’s ideas are connected to present times, and allow readers to reflect about their current moment.
KEYWORDS: Contemporary Portuguese Novel; Historiographic Metafiction; Irony; José Saramago.
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