Um defeito de cor, de Ana Maria Gonçalves: história, dupla consciência e resistência
Resumo
O presente artigo tem por objetivo analisar o romance Um defeito de cor (2006), de Ana Maria Gonçalves, a partir das concepções de liminaridade e de dupla consciência, presentes nas
produções críticas de Eliana Lourenço Reis (1999) e Paul Gilroy (2012). A ideia de personagem liminar emerge da leitura que Reis propõe da obra de Wole Soyinka, constituindo um arcabouço crítico que, em última instância, conceitua a ideia de liminaridade transdiscursiva como o posicionamento fronteiriço que permite a convivência crítica com duas culturas diferentes. A própria ideia de coexistência entre aspectos culturais diversos leva à noção de dupla consciência que, de um modo geral, pode ser vista como a ideia de não pertencimento a uma ou mais formas culturais, o que não exclui a sua apropriação crítica. No romance de Gonçalves, a ideia de personagem liminar vem esboçada na própria constituição da protagonista como alguém que, a despeito das pressões externas, apropria-se de uma identidade brasileira apenas para reforçar a resistência a essa identidade, bem como manter veladamente traços da sua cultura original.
Finalmente, no retorno à África, a personagem ocupa conscientemente esse espaço intersticial de modo a se diferenciar no seio de uma cultura que, de maneira ambivalente, é e não é sua.
The present article’s purpose is to analyze Ana Gonçalves’ novel Um defeito de cor (2006), based on the concepts of liminality and double consciousness, present in the critical productions of Eliana Lourenço Reis (1999) and Paul Gilroy (2012). The idea of a preliminary character emerges from the reading that Reis proposes from the work of Wole Soyinka, constituting a critical framework that, ultimately, conceptualizes the idea of transdiscursive liminality as the border position that allows critical coexistence with two different cultures. The very idea of coexistence between different cultural aspects leads to the notion of double consciousness that, in general, can be seen as the idea of not belonging to one or more cultural forms, which does not exclude its critical appropriation. In Gonçalves’ novel, the idea of a preliminary character is outlined in the protagonist’s own constitution as someone who, despite external pressures, appropriates a Brazilian identity only to reinforce resistance to that identity, as well as to veiled maintain traces of his original culture. Finally, on his return to Africa, the character consciously occupies this interstitial space in order to differentiate himself within a culture that, ambivalently, is and is not his.
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